Portugal, a Igreja e a escravatura – parte II
«No âmbito da Lisboa Capital Ibero Americana de Cultura 2017, o Arquivo Nacional da Torre do Tombo promove uma exposição documental sobre o tema TESTEMUNHOS DA ESCRAVATURA [...].
Esta exposição procura mostrar a realidade que foi o comércio de escravos na sociedade portuguesa desde o seculo XV até ao século XIX. A Bula “Romanus Pontifex” do papa Nicolau V (8 de janeiro de 1455) que concede a D. Afonso V e seus sucessores, a faculdade de poderem fazer comércio com os negros, passando pelas iniciativas legislativas do tempo de Pombal para lhe pôr limites, até à Ratificação pela rainha Vitória do Reino Unido da Grã-Bretanha e Irlanda do Tratado assinado com a rainha D. Maria II, para a completa abolição do tráfico da escravatura (16 de Julho de 1842) e à Lei que aboliu a escravatura em alguns territórios da província de Angola (3 de julho de 1856) no reinado de D. Pedro V».
Quase ao mesmo tempo em que fui ver esta exposição, visitou o presidente da República de Portugal, Marcelo Rebelo de Sousa, o Senegal.
Aí, aproveitou, por exemplo, para visitar a ilha de Gorée que, sob o controlo da coroa portuguesa, foi um importante entreposto no tráfico e comércio de seres humanos (elevados, pois, à categoria de mercadorias) comentando, de resto, que o poder político português reconheceu a injustiça da escravatura quando a aboliu, em parte do território em que detinha a soberania, por ordem do Marquês de Pombal, em 1761.
Reconhecimento tardio, sublinhou.
Outros, no entanto, relevaram o facto de o presidente não ter aproveitado esse momento para, de forma pública, reconhecer as responsabilidades de Portugal, durante séculos, no comércio de milhões de pessoas e no tráfico transatlântico a que, muitas, foram submetidas.
De facto, como explicou a curadora da exposição Um Museu. Tantas Colecções! (patente no Museu Nacional de Arqueologia) Ana Isabel Santos em declarações feitas ao jornal Público: «É preciso ver que não são os portugueses que entram pelo continente e vão ao interior capturar pessoas. Antes da chegada dos navegadores e do estabelecimentos de feitorias já as tribos africanas dominantes, muitas delas islamizadas, escravizavam outras tribos. O que os portugueses fazem depois é negociar com esses traficantes que trazem os escravos do interior».
Assim, a “inovação” que os portugueses trouxeram a esse comércio foi o transporte (o tráfico transatlântico) e a quantidade de pessoas transportadas (milhões).
Foi, precisamente, em Gorée que, quer o papa João Paulo II (em 1992), quer o presidente do Brasil Luíz Inácio Lula da Silva (em 2005), pediram perdão pela escravatura...